quinta-feira, 28 de maio de 2009

A casinha



Sempre disseram que ele era grande e cabiam muitas coisas ali, acho que me acostumei com essa idéia. As coisas foram chegando e fui alojando-as ali dentro. No começo, quando a casa é nova, vamos enfileirando, pondo tudo nas prateleiras, repartições, cheguei até arrumar certas coisinhas por cores. Mas o tempo passa, as coisas começam a aumentar, algumas em tamanhos, outras em proporções; com o tempo passando assim, fui ficando aos poucos sem ele suficiente pra organizar cada coisa em seu lugar, recebia tudo e ia jogando aos cantos, aos lados, ao centro.
As vezes precisava resgatar algo que eu sabia que estava lá, procurava no meio de toda aquela bagunça, encontrando coisas que poderiam ter sido jogadas fora, revirando e colocando tudo às avessas, desarrumando o desarrumado, perdendo e encontrando, e nessa bagunça toda também me perdi.
Deixei-me desencontrada ali, em toda aquela bagunça, revendo cada coisa deixada jogada, e como quem lê cartas velhas, fiquei vivendo de passados remotos, de sentimentos vividos, de amores contidos, de desejos repreendidos.
E quando achei que em toda essa bagunça ninguém mais me encontraria, fechei-me, e a bagunça era tanta que o espaço tornou-se pequeno, sumos saiam de meus olhos porque todos esses sentimentos me espremiam o pequeno coração.
Senti muito medo de tudo, o passado era escuro, frio e sombrio demais pra eu ficar ali sozinha, mas ninguém podia ouvir meus gritos silenciosos, meus murmúrios internos, meu choro contido.
E num repente, você apareceu com sua poesia, à luz começou a se acender, fui abrindo os olhos devagar, a pupila contraindo-se vagarosamente, você insistia, e coloquei-me de pé. Seus versos me convidaram pra uma dança, meus pés sem ritmos contorciam em um louco e frenético movimento. A bagunça era posta pra fora, pois sua poesia tomava conta de todo aquele lugar.
Convidei-o a entrar, o espaço se tornara suficiente para dois, agora poderiam ser apenas um, poderiam ali juntos morar. O convite estava feito, só faltava ser aceito. E enquanto esperava pela resposta, coloquei-me a escrever só para contar.

segunda-feira, 11 de maio de 2009

sexta-feira, 8 de maio de 2009

Enquanto isso, a chuva...


Uma tarde de outono fria e chuvosa, nem tão típica pra região brasileira que moro, meu primeiro ruído naquela tarde foi: "que tédio". Um tempo assim só iria me atrasar, a chuva ia me segurar em casa enquanto meus compromissos deslizariam com a enxurrada que descia. Sentei no sofá e comecei o murmúrio, as lamúrias, meu íntimo solilóquio. Levantei-me e andei em direção a sacada, abrindo devagar as enormes portas de vidro comecei a sentir o vento gélido batendo no meu rosto, avancei até o parapeito e olhei para baixo. As gotas da chuva escorregavam pela janela como uma criança desliza o traseirinho em um tobogã. Nessa analogia interna sorri. Mais adiante, um grupo de amigos aproveitavam a chuva para correrem entre as poças que a água da chuva deixava nos vãos do asfalto, o afeto e a correria se encarregavam de aquecê-los do vento que revirava seus guarda-chuvas. Sorri feliz. Voltei-me pra dentro de mim e pra dentro do apartamento fechando as portas da sacada. Sentei-me novamente no sofá e falei comigo mesma: "o que faz um dia de chuva e frio, ser tão claro e quente como um dia de sol é o calor e a alvura do meu coração." Feliz, botei uma roupa colorida, minha novas galochas cor de rosa, meu guarda-chuva desenhado um sol e saí feliz da vida. Sentindo o frio entrar na minha pele num sinal que eu estava mesmo era quente, e as gotas da chuva que insistiam em me respingar como se quisessem brincar, fazendo de mim, um vivo tobogã.